Em 23 de agosto do ano passado, o Portal Migalhas publicou notícia de que o TJSP julgaria a validade da cláusula de vencimento antecipado da dívida por pedido de Recuperação Judicial do devedor (link). Trata-se do Agravo de Instrumento interposto pelo escritório, em patrocínio dos interesses do Banco Citibank, contra decisão proferida pelo juízo da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central da Comarca de São Paulo/SP, que decretou, de ofício, a nulidade da cláusula que prevê o vencimento antecipado da dívida em caso de distribuição de pedido de Recuperação Judicial, suspendendo imediatamente seus efeitos.
O escritório, no ato da distribuição, obteve decisão atribuindo efeito suspensivo ao Recurso, tendo o Desembargador Relator se utilizado dos seguintes argumentos para tanto:
“Havendo invocação razoável de direito e possibilidade de grave dano, ao agravante, de difícil ou incerta reparação, concedo medida liminar para suspender a decisão agravada apenas no que respeita à suspensão da cláusula de vencimento antecipado.”
O Agravo de Instrumento teve fundamento contestado pela Procuradoria Geral de Justiça, sob o argumento de que “a liberdade contratual no direito moderno não mais pode ser tida por absoluta...a prevalecer a cláusula contratual, a vontade individual do Banco trará reflexos a toda uma comunidade de credores que não participou daquela avença...Caso prevaleça a cláusula contratual, o olhar individualista poderá levar à quebra da empresa, o que certamente desatende à função social do contrato, definida como primordial na atualidade jurídica. É preciso enxergar a autonomia privada sob o mesmo prisma social....sob pretexto da liberdade contratual, os contraentes não podem definir preceitos que contrariem o ordenamento jurídico ou desestruturem os institutos de interesse econômico e social como o da recuperação social...”.
O CMMM sempre foi combativo quanto a posições como as da Procuradoria Geral de Justiça, visto que se inserem numa perigosa penumbra de assistencialismo e de conivência com a formação de dívidas de maneira irresponsável. A manutenção da cláusula e de seu teor é preponderante para evitar o aumento alarmante dos riscos bancários nas operações financeiras, visto que a decretação de nulidade da cláusula impõe reflexos diretos na precificação dos empréstimos e em maiores dificuldades de fomento da economia, tanto para o credor (que fatalmente restringirá sua política de crédito e será mais relutante antes de realizar aportes financeiras), quanto para o devedor (que acabará pagando juros mais altos por força do crescimento exponencial do risco, ou até mesmo fracassando na tentativa de obter crédito na praça).
O Agravo de Instrumento foi totalmente provido, em votação unânime, ocorrida no dia 13 de fevereiro de 2017.
Em voto preciso, o Desembargador Caio Marcelo Mendes de Oliveira asseverou que o pronunciamento do juízo Comarcano é contrário aos termos da Súmula nº 381, editada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, e que estabelece que “nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas”.
Além disso, fulminou a fundamentação da decisão recorrida afirmando que “deve ser observado que em relação aos contratos e às obrigações submetidas ao pedido de recuperação judicial, a medida que determinou a suspensão dos efeitos de cláusula de vencimento antecipado prevista em contrato celebrado entre as partes é inócua, uma vez que todos os créditos das recuperandas – ainda que não vencidos ao tempo do pedido de recuperação judicial – estarão sujeitos ao processo e ao plano de recuperação; Já em relação aos créditos não sujeitos à recuperação judicial, tem-se que o juízo que preside a recuperação judicial não tem competência para deliberar sobre créditos não submetidos à recuperação”.
Trata-se de decisão importantíssima, que certamente há de guarnecer os direitos dos bancos nas Recuperações Judiciais, principalmente quando titulares de crédito com natureza extraconcursal. É precedente fundamental para a conservação das posições iniciais dos contratos bancários e que impede a transferência do risco do empresário aos bancos, que continuarão habilitados a considerar as dívidas antecipadamente vencidas por força da distribuição do pedido de Recuperação Judicial, que, indiscutivelmente, representa, na esmagadora maioria dos casos, não só a confissão de má saúde financeira, como também a alteração substancial das condições preliminares do negócio.
O advogado responsável pela representação do processo foi o Dr. Felipe Enes Duarte da Banca CMMM.
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