De acordo com recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o crédito decorrente dos contratos garantidos por alienação fiduciária não se submete aos efeitos da recuperação judicial, independentemente do bem dado em garantia pertencer à Recuperanda ou a terceiro.
No recurso ao STJ (REsp 1.933.995[1]), a credora defendeu a tese de que seu crédito ostenta natureza extraconcursal, na medida em que o artigo 49, § 3º da Lei 11.101/05 “não faz qualquer restrição ao prestador da garantia da alienação fiduciária.”
Dessa forma, a titularidade originária do bem, não deve afetar a natureza da garantia fiduciária, o que revela o nítido caráter protetivo da norma a todo e qualquer credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, independentemente de quem seja o proprietário original desses bens.
Em contrapartida, são várias as decisões em que os Tribunais Estaduais, quando devidamente deferido o processamento da Recuperação Judicial, considere de natureza quirografária o crédito, em razão de referido bem se encontrar na esfera patrimonial de terceiro, sendo supostamente excluído da regra do artigo 49, §3º da Lei 11.101/2005.
Entretanto, prevalece o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, de que a identificação do fiduciante ou do fiduciário é irrelevante ao objeto da garantia ou com a sociedade recuperanda, afastando da Recuperação Judicial os créditos cujos titulares detenham posição de proprietário fiduciário de bens, preservando a extraconcursalidade do crédito constituído em contrato.
Assim, percebe-se acentuado enfraquecimento da importância do sujeito de direito, seja ele fiduciário ou fiduciante, levando em consideração que, o legislador não delimitou o alcance da regra em relação aos bens alienados fiduciariamente, que façam parte de acervo patrimonial da empresa recuperanda, tendo determinado que o crédito de quem é “titular da posição de proprietário fiduciário” não se sujeita aos efeitos da recuperação.
Com a decisão, se reafirma a posição patrocinada em decisões anteriores como em 2016 no julgamento do REsp 1.549.529[2], na medida em que os ministros consolidaram a tese de que o artigo 49, parágrafo 3º, da Lei 11.101/2005 “não faz qualquer restrição ao prestador da garantia da alienação fiduciária.”
Não poderia ser de outra forma, considerando que, o instituto da alienação fiduciária, uma das modalidades de garantia mais utilizadas nas operações de crédito modernas, foi inserido no sistema jurídico brasileiro com o intuito de atender às necessidades das demandas do sistema financeiro, de modo que representa maior segurança e agilidade na cobrança de dívidas inadimplidas, sem a necessidade de excessiva intervenção do Poder Judiciário, no passo que garante maior proteção para as instituições financeiras que concedem crédito no mercado.
Portanto, impõe-se notar que, o afastamento do credor titular da condição de proprietário fiduciário dos efeitos da recuperação judicial disposto no artigo 49, § 3º, da Lei11.101/2005 é coerente com toda a sistemática legal arquitetada para albergar o instituto da propriedade fiduciária.
Distanciado o referido instituto dos interesses dos envolvidos, tem-se por irrelevante identidade pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem ou com a própria recuperanda, simplificando-se assim o sistema de garantia, de forma que o bem estará indissociavelmente vinculado ao crédito garantido.
Nayara Lima
Acórdãos citados:
(REsp n. 1.933.995/SP (2021/0110157-9), Relator (a) Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/11/2021)
REsp n. 1.549.529/SP (2013/0377786-3), Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 18/10/2016)
[1] (REsp n. 1.933.995/SP (2021/0110157-9), Relator (a) Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/11/2021)
[2] REsp n. 1.549.529/SP (2013/0377786-3), Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 18/10/2016)