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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE SOCIEDADES ANÔNIMAS PELA APLICAÇÃO DO ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL

I – INTRODUÇÃO

O instituto processual da desconsideração da personalidade jurídica tem sido uma importante ferramenta para casos em que a personalidade jurídica é utilizada de forma abusiva, com o fim de prejudicar o direito alheio.

No caso, não é novidade as situações em que o manto da personalidade jurídica é utilizado por pessoas físicas e jurídicas com o intuito de se protegerem de forma fraudulenta de obrigações contraídas, sendo por essa razão a desconsideração da personalidade jurídica prevista em diversos diplomas legais do ordenamento jurídico brasileiro.

Tal tema vem ganhando cada vez mais importância, tendo sido inclusive recentemente positivada no atual Código de Processo Civil de 2015, com o intuito de criar um procedimento específico e detalhado para a aplicação de tal instituto.

Contudo, em que pese as diversas formas e dispositivos legais que abordam a desconsideração da personalidade jurídica, e os diversos tipos de sociedades que podem ser afetadas, o presente trabalho focará na aplicação do art. 50 do Código Civil perante a sociedade anônima, a qual possui determinadas características que podem trazer dificuldades na aplicação desta lei, podendo trazer inclusive dúvidas quanto ao seu cabimento.

Assim, conforme se verá a seguir, o instituto da personalidade jurídica pode sim ser aplicável às sociedades anônimas, mesmo diante das diferentes espécies existentes desse tipo societário, devendo sem dúvidas estar atento o aplicador do direito a determinadas características e especificidades deste tipo de sociedade comercial, sendo este, portanto, o objetivo do presente texto.

II – BREVE RESUMO DO INSTITUTO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Não há dúvidas de que a criação da personalidade jurídica foi de grande importância para o desenvolvimento da atividade empresarial, pois possibilitou às sociedades empresárias adquirir direitos e obrigações em seu próprio nome, desfrutando assim de patrimônio próprio distinto de seus sócios, diminuindo assim os riscos da atividade comercial.

Ocorre que, em muitos casos, o “véu” da personalidade jurídica é utilizado de forma abusiva por empresas e empresários como forma a dificultar o cumprimento de certas obrigações assumidas pela sociedade, como por exemplo facilitando a blindagem patrimonial, quando devedores se aproveitam deste instituto para dificultar o acesso de credores ao seu patrimônio.

Foi em razão desse uso abusivo da proteção de personalidade jurídica que foi analisada pela primeira vez no direito anglo-saxão, dentro do sistema da Common Law, a possibilidade de desconsiderá-la, para que com isso os sócios sejam responsabilizados com o seu patrimônio pessoal pelas obrigações assumidas pela sociedade, sendo essa possibilidade posteriormente difundido para vários outros países.

Conforme se pode notar, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica visa evitar que a aludida personalidade seja um instrumento de fraude ou abuso de direito. Nesse sentido, Fábio Ulhoa Coelho afirma que[1]:

(...) em determinadas situações, ao se prestigiar o princípio da autonomia da pessoa jurídica, o ilícito perpetrado pelo sócio permanece oculto, resguardado pela licitude da conduta da sociedade empresária. Somente se revela a irregularidade se o juiz, nessas situações (quer dizer, especificamente no julgamento do caso), não respeitar esse princípio, desconsiderá-lo ”.

Antes de ser normatizado no Brasil, esse instituto era aplicado pela jurisprudência de seus tribunais, sendo somente tipificada em lei pela primeira vez no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), mais precisamente em seu art. 28, o qual visa proteger o consumidor contra o abuso de direito de um fornecedor no uso da sua personalidade jurídica, quando ela for um empecilho ao ressarcimento dos danos causados em uma relação consumerista.

Em seguida foi abordada pela Lei Antitruste de nº. 8.884/1994, em seu art. 18, onde prevê a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade que vier a cometer crimes contra a ordem econômica, quando ocorrer abuso de direito, infração à lei ou aos contratos e estatutos sociais, dentre outros casos no âmbito de atuação da citada lei.

Foi ainda prevista pela Lei de Crimes Ambientais de nº. 9.605/1998, a ser aplicada quando a personalidade jurídica for um empecilho para o ressarcimento dos danos ambientais causados por meio da atividade empresarial.

Contudo, foi somente com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 que esse instituto foi devidamente tipificado para a aplicação para todas as demais relações civis, tendo como fundamento para a sua aplicação o abuso no uso da personalidade jurídica, o qual estaria caracterizado pela confusão patrimonial ou desvio de finalidade, podendo nestes casos as obrigações da pessoa jurídica ser estendida para as pessoas dos sócios, conforme determina o seu art. 50, a seguir destacado:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

 

Com o decorrer da aplicação prática de tal dispositivo legal, foi reconhecida na jurisprudência a possibilidade de ser realizar o caminho inverso ao contido na letra da lei, ou seja, através do sócio atingir o patrimônio de sua sociedade, na chamada desconsideração inversa.

Com relação ao seu efeito prático, é válido ressaltar que o objetivo de tal dispositivo legal não é extinguir a existência da pessoa jurídica, mas sim fazer com que seus sócios sejam também responsáveis por determinadas obrigações da pessoa jurídica, cuja a personalidade foi utilizada de forma abusiva.

Nesse sentido, ensina Fábio Ulhoa Coelho: “A aplicação da teoria da desconsideração não implica a anulação ou desfazimento do ato constitutivo da sociedade empresária, mas apenas a sua ineficácia episódica[2].

Há ainda a Lei 12.843/2013, conhecida como Lei Anticorrupção, onde prevê em seu art. 14 a desconsideração da personalidade jurídica sempre que esta for utilizada para encobrir ou dissimular a prática dos crimes previstos na aludida lei, sendo estendidos aos sócios e administradores da sociedade os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica.

Por fim, o último diploma legal a tratar da desconsideração da personalidade jurídica, foi a Lei 13.105/2015, a qual regula o Novo Código de Processo Civil, onde foi trazido pela primeira vez a criação de um procedimento específico para que seja declarada a desconsideração da personalidade jurídica, garantido assim o contraditório em favor das pessoas a serem atingidas pela desconsideração.

No entanto, o presente trabalho manterá o seu foco na aplicação do art. 50 do Código Civil para as sociedades anônimas, tendo em vista as características peculiares que este tipo societário possui, e quais as suas consequências frente à aplicação do aludido instituto.

Ocorre que, em regra, tal procedimento já vem sendo facilmente aplicado em face de sociedades limitadas, seja a princípio por ser a forma societária mais difundida no Brasil, seja ainda em razão do fato de que seus sócios possuem cotas sociais as quais estão restritas à sua responsabilidade, sendo eles facilmente identificáveis, sendo todos eles atingidos em regra pela desconsideração quando ela é cabível.

Já as sociedades anônimas, sejam elas de capital aberto ou fechado, possuem determinadas características que podem trazer dúvidas quanto à efetiva aplicação deste instituto, sendo necessário assim uma análise mais aprofundada sobre essa questão.

III – PARTICULARIDADES DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS

As sociedades anônimas foram criadas com o intuito de possibilitar a certas empreitadas um maior acesso a investimentos, oportunizando-se a todos os interessados a chance de ingressarem como acionistas de uma sociedade ao comprar parte de suas ações, garantindo com isso a capitalização de recursos para a sociedade empresária, através da negociação dessas ações.

Especificamente, a conceituação legal desse tipo societário consta no art. 1º da Lei 6.404/1976, lei esta que regula as sociedades anônimas, onde consta que: “A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.”

Conceituação idêntica é dada pelo Código Civil de 2002 em seu art. 1.088, onde consta que: “Na sociedade anônima ou companhia, o capital divide-se em ações, obrigando-se cada sócio ou acionista somente pelo preço de emissão das ações que subscrever ou adquirir”.

Dessa forma, conforme se pode notar, um dos elementos essenciais da natureza deste tipo societário é justamente a limitação da responsabilidade do acionista ao preço de suas ações, sendo este um dos seus principais atrativos, eis que possibilita à sociedade anônima capitar recursos de diversos investidores, sem que estes corram o risco de se verem responsabilizados pelas obrigações assumidas pela sociedade.

Sobre esse assunto, ensina Rubens Requião: “A sociedade anônima, com efeito, tornou-se eficaz instrumento do capitalismo precisamente porque permite à poupança popular participar dos grandes empreendimentos, sem que o investidor, modesto ou poderoso, se vincule à responsabilidade além da soma investida, e pela possibilidade de a qualquer momento, sem dar conta de seu ato a ninguém, negociar livremente os títulos, obtendo novamente a liquidez monetária desejada”.[3]

Assim, este tipo societário é comumente classificado como uma sociedade de capital, eis que seus sócios, no caso os acionistas, não são escolhidos por seus atributos pessoais, não havendo entre eles em regra o affectio societatis, mas adentram na sociedade ao investir o valor correspondente a sua participação, sendo neste caso o recurso financeiro, ou o capital aplicado, o elemento central de constituição de uma pessoa no quadro de acionistas de uma empresa desta natureza.

Ou seja, o que se espera de um acionista é que ele capitalize a sociedade com a aquisição de suas ações, não sendo relevante nesse sentido qualquer aspecto pessoal deste, sendo necessário apenas que invista o valor necessário para a aquisição de um certo número de ações.

Dessa forma, pode-se notar um primeiro empecilho para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, tendo em vista esta característica de conferir aos acionistas a segurança de que o risco do negócio terá como limite o valor de suas ações.

O segundo deles é o fato de seu capital social não estar divididos por cotas, mas sim por ações, que podem ser livremente negociadas dependendo do caso, não sendo assim facilmente identificável a figura do sócio, ou neste caso do acionista, já que este não é escolhido pelos seus atributos pessoais, conforme já destacado, mas sim adentra no quadro acionário ao adquirir as ações, com o respectivo investimento.

Em terceiro lugar, destaca-se que a administração e execução das atividades desse tipo societário é dividido em órgãos sociais internos, os quais podem ser divididos em três categorias, sendo elas os órgãos de deliberação, os órgãos de execução e os órgãos de fiscalização.

Sendo as suas atividades divididas por órgãos internos, não sendo alguns deles necessariamente exercidos pelos acionistas, estando a direção das sociedades anônimas muitas vezes a cargo de pessoas que não fazem parte do quadro acionário, pode haver dúvidas assim quanto a quem será de fato atingido pela desconsideração da personalidade jurídica.

Por fim, necessário ainda destacar que as sociedades anônimas podem ser de capital fechado ou aberto, conforme previsão do art. 4º da Lei 6.404, sendo o diferencial entre estes dois tipos a disponibilidade das ações para venda a terceiros, pois as de capital aberto estão com suas ações livres para a comercialização nos mercados de balcão ou bolsa de valores, sendo que nas de capital fechado isso não ocorre, sendo o seu quadro acionário rígido.

Tendo em vista todas essas características das sociedades anônimas, pode-se questionar o efetivo cabimento da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, ou mesmo a sua viabilidade.

No caso, não restam dúvidas ser mais dificultosa de ser requerida e reconhecida a desconsideração da personalidade jurídica das sociedades anônimas, ainda mais quando de capital aberto. Por essa mesma razão, este tipo societário passa a ser um frequente instrumento de expedientes fraudulentos, tal como a blindagem patrimonial de pessoas físicas ou jurídicas em desfavor de seus credores.

Por essa razão, será discutido a seguir a possibilidade e a forma com que a desconsideração da personalidade jurídica poderá ser aplicada em face das sociedades anônimas.

IV – DA POSSIBILIDADE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE SOCIEDADES ANÔNIMAS PELA APLICAÇÃO DO ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL

Conforme se pode notar pelo teor do art. 50 do Código Civil e de outros dispositivos legais relativos ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, não há qualquer menção a um tipo societário específico, sendo assim em regra aplicável em face de qualquer espécie de sociedade, desde que ela esteja sendo utilizada com abuso de sua personalidade jurídica.

Assim, ainda que certas características das sociedades anônimas podem dificultar a aplicação deste instituto, não se pode haver dúvidas de que ela pode ter desconsiderada a sua personalidade jurídica com a aplicação do aludido dispositivo legal, caso seja ela utilizada de forma abusiva, principalmente com o intuito de proteção patrimonial, ou com o desvio de sua finalidade.

Neste caso, ao desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade anônima, uma das primeiras dúvidas que podem surgir é: pode ser efetivada a desconsideração sobre as suas duas espécies (aberta ou fechada)? Quem será afetado? Os acionistas? Os administradores que a dirigem? Ambos? No caso dos acionistas, a aplicação desse instituto não violaria o princípio fundamental das sociedades anônimas quanto à extensão de suas responsabilidades?

Com relação a este assunto, em primeira análise entende-se que serão os acionistas a serem atingidos pela desconsideração da personalidade jurídica, no sentido de que sejam solidariamente responsáveis pelas obrigações assumidas pela sociedade, respondendo assim com seu próprio patrimônio.

No caso, são os acionistas os sócios da sociedade anônima[4], assumindo eles o ônus e o bônus da atividade empresária da qual participa e, apesar da existência de diversos órgãos para a sua administração, são eles que, por meio das assembleias gerais, tomam as principais decisões deliberativas com relação às atividades da sociedade.

No entanto, tendo em vista a principal característica deste tipo societário, que é justamente trazer ao acionista a segurança de que a sua responsabilidade está vinculada apenas ao valor de suas ações, deve-se ter em mente que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica é usado justamente quando estas características são utilizadas de forma abusiva, sendo assim uma exceção à regra.

Para tanto, necessário se faz que esteja demonstrado o uso abusivo da personalidade jurídica por parte da sociedade anônima, através de confusão patrimonial ou desvio de finalidade, uso este será por parte de acionistas, seja ele pessoa física ou jurídica.

Assim, a extensão das responsabilidades dos acionistas é alargada quando eles próprios subvertem o instituto da personalidade jurídica, com o fim de se proteger de certas obrigações. No caso do art. 50 do Código Civil, isso ocorre com o desvio da própria finalidade da pessoa jurídica, ou com a confusão patrimonial entre sócios e a sociedade.

No entanto, poderia ser alegado que tal entendimento constitui uma afronta ao art. 117 da Lei 6.404/1976, o qual estabelece que o acionista controlador responderá pelos danos que causar, por atos praticados com abuso de poder, sendo somente as situações previstas no parágrafo 1º as únicas suscetíveis de responsabilizar pessoalmente o acionista controlador.

Contudo, o dispositivo acima possui como âmbito de aplicação os casos em que a conduta do acionista cause danos à própria sociedade, ainda que tais atos possam causar danos à terceiros. Já o art. 50 do código Civil deve ser aplicado nos casos em que os atos do acionista consistem em abuso na personalidade jurídica que cause danos a terceiros, ou seja, são normas para a aplicação em situações diversas ainda que não excludentes.

Neste caso, não há dúvidas de que muitas das situações que se enquadrem no art. 50 do Código Civil, tais como fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, podem vir a se enquadrar também dentre as hipóteses de abuso de poder do acionista controlador contidas no parágrafo 1º do art. 117 da Lei 6.404/1976, não sendo tais dispositivos excludentes, comportando eles as devidas aplicações, dentro do âmbito de cada um, respondendo assim o acionista perante as obrigações assumidas pela sociedade com o abuso da personalidade jurídica sob o seu controle e pelos danos causados à própria sociedade em razão dessa mesma conduta.

Portanto, resta claro que o art. 117 da Lei 6.404/1976 não afasta a aplicação do art. 50 do Código Civil, tendo inclusive a jurisprudência do e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já se manifestado nesse exato sentido[5].

Além disso, necessário se faz destacar a aplicação do aludido art. 50 em face às duas espécies de sociedades anônimas, previstas no art. 4º da Lei 6.404, sendo elas a de capital aberto e a de capital fechado.

Neste sentido, ressalta-se que tanto a sociedade anônima de capital fechado, quanto a de capital aberto, podem ter sua personalidade jurídica desconsiderada, não havendo dúvidas de que no primeiro caso é uma tarefa muito mais simples, pois existem entre os sócios das sociedades anônimas de capital fechado o chamado affectio societatis, ou seja, existe entre eles o interesse em se associarem dentre si, sendo relevante neste caso o aspecto pessoal de cada um, tanto que é vedada a livre negociação das ações nestas sociedades.

Dessa forma, na prática uma sociedade anônima de capital fechado adquire características de sociedade pessoal, sendo semelhante em vários aspectos à sociedade limitada. Nestes casos, muitas vezes os administradores são os próprios acionistas.

Assim, ao ser reconhecido que a sociedade anônima de capital fechado está se utilizando de forma abusiva da personalidade jurídica, a sua desconsideração deverá atingir todos os seus acionistas, assim como ocorre com a desconsideração da sociedade limitada.

Já no caso das sociedades anônimas de capital aberto, entende-se também pelo cabimento da aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, quando restar evidente a ocorrência das ocasiões previstas no art. 50 do Código Civil[6], devendo ter em mente que a demonstração neste caso de abuso de personalidade jurídica por parte de algum dos acionistas será muito mais difícil de restar demonstrada.

Neste caso, deve o acionista que se utilizou da personalidade jurídica de forma abusiva ter, a princípio, um número de ações suficientes para exercer o controle sobre a sociedade, ou de alguma outra situação que demonstre ter ele poder de decisão e veto sobre os rumos da atividade da empresa, já que o simples fato de uma pessoa ser acionista de uma empresa não significa necessariamente possuir ela arbítrio sobre os rumos da atividade da sociedade da qual participa.

Ou seja, no caso das sociedades anônimas de capital aberto, a desconsideração da personalidade jurídica prevista no art. 50 do Código Civil deverá atingir o acionista controlador, o qual consiste, nos exatos termos do art. 116 da Lei 6.404/1976: “pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia”.

Assim, este é um consectário lógico para a aplicação deste instituto, não apenas para que possa assim restar comprovado a ocorrência de um ato por parte do acionista no uso abusivo da personalidade jurídica da sociedade anônima, mas também para preservar o acionista que não tenha praticado qualquer abuso nesse sentido, ou mesmo se beneficiado do uso irregular da personalidade jurídica, preservando dessa forma um dos fundamentos da sociedade anônima que é a responsabilidade do acionista vinculada ao valor das ações que possui.

Assim, nas sociedades anônimas, deve restar comprovada a conduta lesiva de extrapolação dos limites legais da personalidade jurídica por parte dos acionistas, caso a sociedade sob as suas ordens tenha procedido com abuso de sua personalidade.

Outra possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica é quando ocorre a existência de grupo econômico de fato, existente quando determinadas sociedades possuem uma direção conjunta, exercida através da participação societária entre elas, que no caso das sociedades anônimas ocorre quando se é acionista, formando muitas vezes uma verdadeira cadeia de empresas.

O grupo econômico de fato, ao contrário do grupo de direito, decorre de uma situação fática, sem que haja necessariamente qualquer formalização jurídica nesse sentido. Com relação a este tema, destaca-se o conceito de Rubens Requião:

“São grupos de fato as sociedades que mantêm, entre si, laços empresariais através da participação acionária, sem a necessidade de se organizarem juridicamente. Relacionam-se segundo o regime legal de sociedades isoladas, sob a forma de coligadas, controladoras e controladas, no sentido de não terem necessidade de maior estrutura organizacional”.[7]

Nesse sentido, é extremamente comum a existência de grupos econômicos de fato, muitas vezes compostos por sociedades anônimas, quando elas formam uma cadeia de empresas com cada uma fazendo parte do quadro acionário de outra, exercendo sobre elas controle direito e indireto.

Assim, para a configuração do grupo de fato, necessário restar evidenciado uma direção conjunta, em busca dos mesmos fins, atuando as diversas sociedades de forma coordenada e organizada em busca do sucesso comercial de todo o grupo.

Dessa forma, esta organização pode se dar por coligação entre sociedades, ou quando uma exerce o controle sobre as outras, estando estes dois conceitos contidos nos parágrafos do art. 243 da Lei 6.404/1976, bem como nos artigos 1.097 a 1.099 do Código Civil, onde em resumo considera-se uma sociedade controladora aquela que diretamente ou por meio de outras controladas é titular de direitos que lhe conferem predominância nas decisões da sociedade controlada, juntamente com o poder de eleger a maioria dos administradores.

Já coligada seria aquela que uma sociedade possui influência significativa sobre a outra, sendo isto reconhecido quando se detém ou se exerce poder de participação nas decisões das políticas financeira ou operacional da coligada, sendo que se presume tal influência quando a empresa acionista possui 20% (vinte por cento) ou mais do capital votante, sem controlá-la (art. 243 parágrafos 4º e 5º da Lei 6.404/1976), sendo que o art. 1.099 do Código Civil estabelece o percentual mínimo de 10% (dez por cento) para tanto.

Nestes casos, também é cabível a desconsideração da personalidade jurídica de uma sociedade anônima para atingir outras sociedades que, por meio da coligação ou controle, utilizem da personalidade jurídica da sociedade devedora de forma abusiva, desviando de seu objetivo social ou havendo a confusão patrimonial. A ocorrência deste último item muitas vezes resta evidente quando na prática não se consegue observar uma divisão de fato entre as atividades das sociedades, utilizando-se uma do patrimônio da outra.

Nesses casos, a divisão patrimonial serve apenas para inviabilizar a busca dos credores por ativos que poderiam garantir seus créditos, por estarem eles teoricamente dentro da esfera patrimonial de outra empresa controlada, controladora ou coligada, quando na prática todas as sociedades fazem uso de tais ativos.

Além disso, pode ocorrer o abuso da personalidade jurídica quando a direção do grupo de empresas é realizada de forma conjunta, com o fim de possibilitar a blindagem do patrimônio dessas ou da própria controladora.

Em todos estes casos, a desconsideração da personalidade jurídica das sociedades anônimas visa atingir as outras sociedades a ela controlada, ou controladora ou até mesmo coligada, quando esta estrutura é utilizada de forma abusiva, conforme previsão do art. 50 do Código Civil, para que todas as sociedades deste grupo sejam solidariamente responsáveis pelas obrigações adquiridas por uma delas.

Por fim, é válido tecer algumas considerações com relação à possibilidade de se atingir não apenas os acionistas de uma sociedade anônima, mas também seus administradores. Neste caso, válido ressaltar que em regra os administradores não são responsabilizados pelos atos de gestão da sociedade praticados no exercício de suas atividades, eis que agem em nome e por conta da sociedade em que atuam.

Assim, via de regra não poderão ser atingidos por uma eventual desconsideração da personalidade jurídica. Contudo, a própria lei das sociedades anônimas prevê situações em que os administradores responderão pelos prejuízos que causar no exercício de suas atividades, quando agir com culpa ou dolo, ou quando violar a lei ou estatuto. Nestes casos, responderão os administradores perante à sociedade a que pertencem, pelos danos causados.

Já com relação à aplicação do art. 50 do Código Civil, entenda-se ser possível em face dos administradores da sociedade anônima, devendo se atentar que neste caso haverá enormes dificuldade na sua configuração e aplicação, pois deverá ser comprovada o uso pelos administradores do abuso da personalidade jurídica da sociedade da qual fazem parte.

No caso deverá estar evidente a configuração de um ato por parte do administrador que venha a configurar as situações previstas no art. 50 do Código Civil, estando demonstrado que este agiu com o intuito de prejudicar terceiros com a utilização abusiva da personalidade da sociedade de que participa.

Neste sentido, caso estes atos sejam em razão de ordens emanadas dos acionistas, através do uso de seus poderes através dos órgãos deliberativos, tendo os administradores apenas operacionalizados tais ordens, deverá a desconsideração da personalidade jurídica atingir em regra os acionistas, conforme já destacado.

Contudo, se restar demonstrado que agiu o administrador em extrapolação de suas competências, tendo ele agido com o intuito de, por exemplo fraudar credores da sociedade, através da confusão patrimonial, poderá sim ser solidariamente responsável pelas obrigações cujo cumprimento restou prejudicado.

Destaca-se, nesse sentido, que o próprio texto legal do art. 50 do Código Civil consta o termo administradores, como sendo um dos que podem sofrerem os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica.

Neste sentido, resta claro que muitas dessas atitudes do administrador que se enquadrem como abuso da personalidade jurídica, enquadre também em alguma das situações contidas no art. 158 da Lei 6.404/1976, o qual prevê os casos em que o administrador será pessoalmente responsável pelos danos causados, devendo também neste caso responder perante à sociedade em que atua pelo prejuízo que causou.

Contudo, percebe-se não apenas mais dificultosa para comprovar o abuso da personalidade jurídica em face do administrador, ou administradores da sociedade anônima, como também pode ser muito mais dificultosa de ser concretizada, em razão do número de administradores e a troca destes com o passar do tempo, podendo um determinado ato ter sido praticado no período de atuação de diversos deles.

Obviamente nos casos em que a pessoa do acionista se confunde com a do administrador da sociedade, ocorrência comum nas sociedades de capital fechado, ao ser desconsiderada a personalidade jurídica será atingida a pessoa do administrador.

Contudo, o importante em todos estes casos é dar efetividade ao art. 50 do Código Civil, ainda que em alguns deles o abuso da personalidade jurídica resta mais dificultoso de ser demonstrado e, além disso, muito mais complexo de ser efetivamente aplicado em razão de certos tipos societários ou pela complexidade da estrutura social realizada, eis que é um importante instrumento de coibição de fraudes e abusos na personalidade jurídica.

Todas as possibilidades contidas neste texto estão sendo cada vez mais aplicadas pela jurisprudência dos tribunais brasileiros[8], ainda que em alguns casos entendeu-se que somente a sociedade anônima de capital fechado poderia ter a sua personalidade jurídica desconsiderada, entendemos que eventuais dificuldades nesse sentido não devem ser empecilho para a aplicação do dispositivo legal aqui em discussão.

Conforme se pode notar, não há dúvidas que em muitos casos a sua configuração resta dificultosa, mas sempre que for possível auferir a existência do abuso da personalidade jurídica, o art. 50 do Código Civil deverá ser aplicado.

V – CONCLUSÃO

Conforme visto, não há no art. 50 do Código Civil qualquer menção ou especificação que diminua a sua área de atuação conforme o tipo societário, devendo ser aplicada assim toda vez em que se verificar o abuso no uso da personalidade jurídica.

Assim, não seria diferente com relação às sociedades anônimas, ainda que algumas de suas características venha a dificultar a verificação da situação de abuso e a aplicação do dispositivo aqui em questão.

Neste sentido, notou-se pelo presente texto que, o elemento essencial para se verificar quem será atingido por tal instituto da desconsideração da personalidade jurídica é aquele que de fato realizou e beneficiou-se de tal conduta.

Por essa razão entende-se pela máxima efetividade do art. 50 do Código Civil, devendo ele ser aplicado para os mais diversos tipos societários, dentre eles as sociedades anônimas, inclusive as de capital aberto, pois não há qualquer justificativa no âmbito ético que possa restringir o âmbito de aplicação do aludido dispositivo.

Ora, o instituto da personalidade jurídica foi somente nos últimos anos devidamente positivado no nosso ordenamento jurídico, o que não lhe diminui a sua importância sendo, portanto, imprescindível que seja cada vez mais discutido o seu âmbito de aplicação, sendo o art. 50 do Código Civil um valoroso avanço nesse sentido, dada a sua importância para proteger o instituto da personalidade jurídica, bem como a boa-fé nas relações jurídicas.

 


[1] COELHO, Fábio Ulhoa; Curso de Direito Comercial, volume 2: direito de empresa – 19ª ed. – São Paulo/SP: Saraiva, 2015. Fls. 55.

[2] COELHO, Fábio Ulhoa; Curso de Direito Comercial, volume 2: direito de empresa – 19ª ed. – São Paulo/SP: Saraiva, 2015. Fls. 64.

[3] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 2º volume; 32ª edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015.

[4] Com relação a este assunto, segue os ensinamentos de Rubens Requião: “Acionista é o sócio da sociedade anônima. O art. 1º da atual lei refere-se aos ‘sócios acionistas’. É elementar que a designação de sócio se apresenta genérica, e traduz a ideia da pessoa que se associa com outrem, juntando seus cabedais, para constituir a sociedade mercantil, ao passo que o acionista se aplica especificamente ao membro da sociedade anônima ou companhia.” REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 2º volume; 32ª edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015; fls. 179.

[5] “RECURSO. Embargos de declaração. Omissão reconhecida pelo C. STJ. Determinação de enfrentamento da alegação de que o v. acórdão violou os artigos 117 e 158 da Lei nº 6.404/1976. Regras de responsabilização dos sócios dos artigos 117 e 158 da Lei nº 6.404/76, podem ser excepcionadas pelo instituto da desconsideração da personalidade jurídica - de acordo com os parâmetros determinados pelo artigo 50 do Código Civil e artigo 28, §5º, do CDC - eis que inexiste norma especial na Lei nº 6.404/76. EMBARGOS ACOLHIDOS, SEM EFEITO INFRINGENTE. (...) De fato, em conformidade com os artigos 117 e 158 da Lei nº 6.404/76, em regra, nas sociedades anônimas os acionistas não respondem pelas obrigações da empresa, salvo se demonstrada a existência de abuso de poder, de atuação com dolo ou culpa, de violação da lei ou do estatuto. Contudo, o simples fato de ser a empresa uma sociedade anônima não poderia afastar a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica e a interpretação dos referidos artigos deve ser interpretada de forma conjunta e complementar com o artigo 50 do Código Civil e com o artigo 28, §5º, do CDC. Destarte, embora a responsabilidade subsidiária seja regra geral de Direito Societário (artigo 1024 do Código Civil), deve ser observado que a respectiva incidência depende da existência de separação patrimonial entre a sociedade e os sócios. Por conseguinte, existindo a desconsideração da pessoa jurídica, afastasse a separação patrimonial e, por consequência, a responsabilidade subsidiária, porquanto desconsiderar a pessoa jurídica implica responsabilizar, direta e

pessoalmente, os sócios e administradores indicados, como se estas pessoas tivessem assumido, em nome próprio, as obrigações imputáveis à pessoa jurídica.  (TJSP;  Agravo de Instrumento 2191919-25.2015.8.26.0000; Relator (a): Silvia Maria Facchina Esposito Martinez; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José do Rio Preto - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 06/09/2017; Data de Registro: 06/09/2017)” Grifo nosso.

[6] Com relação a este ponto, segue jurisprudência do e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo onde a desconsideração da personalidade jurídica atingiu a empresa Gafisa S/A, uma sociedade anônima de capital aberto:

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - GRUPO GAFISA - Extensão dos efeitos da execução à sociedade integrante do mesmo grupo empresarial - Confusão patrimonial e manobras societárias inviabilizam a satisfação do crédito - Cobrança de multa compensatória - Precedentes da Corte - Decisão mantida -Agravo desprovido. (...) As informações extraídas do histórico apresentado à CVM - Comissão de Valores Mobiliários às fls. 1.255/1.257, corroboram a proximidade empresarial entre a Cimob Companhia Imobiliária e Gafísa S.A.“ (TJSP; Agravo de Instrumento 0087023-38.2010.8.26.0000; Relator (a): Percival Nogueira; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 31ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/06/2010; Data de Registro: 05/07/2010)

[7] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 2º volume; 32ª edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015.

[8] Nesse sentido, segue um exemplo de jurisprudência do e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo com relação a este tema:

“APELAÇÃO CÍVEL – Interposição contra sentença que julgou improcedentes os embargos de terceiro. Desconsideração inversa da personalidade jurídica já deferida na ação de rescisão contratual e mantida por este Tribunal. Apelante que se limitou a repetir a tese já afastada. Penhora de numerário justificada, ante a prova robusta de conduta fraudulenta, que visa a frustrar a execução. Sociedade anônima que também pode ter sua autonomia patrimonial desconsiderada. Honorários advocatícios majorados nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015. Sentença mantida.

‘(...)o fato de a apelante constituir-se como sociedade anônima não impede a desconsideração de sua personalidade jurídica, uma vez que apenas a responsabilidade ordinária é limitada às ações dos respectivos sócios. Ou seja, provado o abuso da personalidade ou a confusão patrimonial, é desconsiderada a autonomia patrimonial para se atingir os bens da sociedade. Nenhuma ilegalidade há, portanto, na aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, direta ou inversa, nas sociedades anônimas’”. (TJSP;  Apelação 1012232-23.2015.8.26.0577; Relator (a): Mario A. Silveira; Órgão Julgador: 33ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José dos Campos - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/07/2017; Data de Registro: 04/07/2017) Grifo nosso.

VOTO CONTRÁRIO DO CREDOR AO PLANO DE RECUPREAÇÃO JUDICIAL NÃO CONFIGURA, PER SE, ABUSO DE DIREITO DE VOTO

Em recente decisão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou a sentença de
concessão da recuperação judicial à DHB Componentes Automotivos S/A e outros, com
fundamento no abuso de direito de voto das Instituições Financeiras e posterior aplicação do
“cram down”.
Na Assembleia Geral de Credores, o plano recuperacional foi reprovado por duas das quatro
classes existentes (rejeição pelas classes II e III). Desta forma, para a concessão da recuperação
judicial, a magistrada da Vara Especializada de Porto Alegre aduziu que as Instituições
financeiras abusaram de seu direito de voto, pois se posicionaram de forma contrária ao plano
apresentado pela empresa. Importante destacar que dois Bancos possuíam grande
porcentagem de crédito dentro de suas respectivas classes (um deles possui 65,65% dos créditos
na classe II e o outro possui 37,97% dos créditos na classe III).
De acordo com a magistrada, a mera aprovação da maioria dos credores demonstra a viabilidade
econômica das Recuperandas. Quanto aos Bancos (ao rejeitarem o plano) abusaram de sua
posição de dominância, em detrimento dos demais credores. Transcreve-se trecho da decisão
reformada:
“A análise da conduta da grande maioria dos credores demonstra que o plano possui
sentido econômico e que, portanto, os votos das instituições financeiras foram abusivos,
notadamente em relação ao Banrisul e BNDES, que abusaram de suas posições de
dominância em relação aos demais credores."
Ou seja, a decisão de primeira instância entendeu que o posicionamento contrário ao plano, per
se, é abusivo. Por conseguinte, em nome do princípio da preservação da empresa, declarou o
abuso do voto dos Bancos credores com base no artigo 187 do Código Civil:
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes.”
Com a declaração de abusividade do voto de alguns credores, aplicou o “cram down”, previsto
no inciso III do artigo 58 da Lei. Por referido instituto, em casos excepcionais, é possível a
concessão da recuperação judicial ainda que o plano tenha sido rejeitado em Assembleia.
Contudo, mesmo com a desconsideração dos aludidos votos, não havia as condições necessárias
para a aplicação do “cram down”. No caso em tela, houve reprovação do plano recuperacional
em duas classes. Sem olvidar-se que na classe III houve a aprovação de apenas 30% dos credores
presentes (mesmo depois da exclusão do voto do maior credor), quando deveria ter, no mínimo,
1/3 dos votos dentre outros requisitos cumulados.
Em recurso, um dos bancos credores da classes III, representado pelo escritório Carmona Maya,
Martins e Medeiros Advogados, interpôs agravo de instrumento em face da sentença proferida.
Em suas razões recursais, demonstrou que o voto contrário à aprovação do plano não implica
em abusividade de voto, mas sim exercício regular de direito, ante às péssimas condições de
pagamento previstas no plano (deságio de 45% do crédito, carência de 2 anos e pagamento da
dívida em 15 anos para a classe III).Também, a inexistência de condições para aplicação do “cram
down” mesmo depois da exclusão do voto dos Bancos credores.
O V. acórdão (AI nº 0443669-72.2016.8.21.7000), por unanimidade, acolheu todas as razões
postas e reconheceu que os votos contrários dos Bancos decorreu das nefastas condições
econômicas que lhes foram impostas. Desta forma, não vislumbrou nenhuma ilegalidade no
posicionamento adotado pelos Bancos. Por conseguinte, reformou-se a sentença concessiva da
recuperação judicial, vez que não preenchidos os requisitos. Colaciona-se a irretocável decisão
colegiada:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO
JUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. INSTITUTO DA “CRAM DOWN”. INAPLICABILIDADE. CASO
CONCRETO. CONVOLAÇÃO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM FALÊNCIA.
I. Como é sabido, sob a ótica do instituto da Cram Down, o Magistrado está autorizado
a impor o plano de recuperação judicial aos credores discordantes, desde que
preenchidos os requisitos previstos no art. 58, § 1º, I, II e III, e § 2º, da Lei nº 11.101/2005.
II. No caso, porém, o plano de recuperação judicial das agravadas, levado à votação na
Assembleia Geral de Credores, não preencheu os requisitos elencados no § 1º, II e III e §
2º, da referida norma legal. Da mesma forma, os votos de rejeição dos credores
majoritários não se revestiram de abusividade.
III. Aliás, descabe ao Judiciário analisar eventual viabilidade econômica do plano de
recuperação judicial, devendo prevalecer a vontade majoritária dos credores,
constituída através da Assembleia Geral. Assim sendo, imperativo o reconhecimento
da validade do voto de todos os credores e, por conseguinte, a convolação da
recuperação judicial em falência.
AGRAVO PROVIDO.”
Com efeito, o E. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul privilegiou a correta aplicação da Lei
11.101/05 e seus institutos, reconhecendo que o princípio da preservação da empresa não se
sobrepõe à soberania das decisões dos credores quanto às condições econômicas apresentadas
pela empresa em recuperação judicial.

A SIMULAÇÃO, O DIREITO INTERTEMPORAL E A AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE

Em tempos de vigência da nova Lei Processual, em que pese ser assunto de moda a formação de incidentes de desconsideração de personalidade jurídica por parte de credores ao perseguirem créditos de seus respectivos devedores, cabe chamar a atenção para outro instrumento um pouco em desuso, o qual seja, a existência de simulação e a ação declaratória de nulidade, meio que a sistemática brasileira prevê para casos de conluios.

A fim de trazer um debate de âmbito de direito material à questão, serve o presente para apontar questão de direito intertemporal na medida em que os diplomas civis de 1916 e 2002 divergem sobre o tratamento do vício em epígrafe, tratado como de cunho social pelo Código de Reale. Em breves linhas, como noção introdutória, a problemática do presente gira em torno da eventual decadência que não mais ocorre nos casos comprovados de simulação, o que castigava as vítimas do conluio formado na vigência do Código de 1916.

Antes de adentrar nos critérios para aplicação da lei no caso concreto com relação ato simulado praticado na vigência do Código Civil de 1916, e que também produz efeitos durante a vigência do Código Civil de 2002, é imprescindível relembrar conceitos de simulação, nulidade e decadência.

  1. Simulação

Tem vez a simulação quando o agente pretende, em suma, esconder a realidade de terceiro, podendo o ato ser considerado também fingimento ou mesmo camuflagem da real intenção a qual se destina. O cerne da simulação reside no fato de se criar intencionalmente um cenário que não representa a real intenção das partes que, contratualmente ou em declaração, exteriorizam vontade diferente da que realmente desejam.

Como exemplo meramente ilustrativo, imagina-se que determinada pessoa deve quantia considerável para credores e pretende resguardar seu patrimônio contra eventuais expropriações em caso de inadimplência. Casado este com seu cônjuge finge o divórcio e, na partilha o devedor cede uma casa e um automóvel para o suposto divorciando.

Apesar de “divorciados”, devedor e cônjuge vivem como se casados fossem com convívio familiar, como se o divórcio não tivesse sido realizado. Neste caso ficou evidente que a declaração exteriorizada pelo casal não representa a real vontade, mas sim foi um ato criado simplesmente para ludibriar credores.

O que se verifica na simulação é a diferença da vontade que realmente se tem da que se declara. O Desembargador aposentado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, Itamar Gaino cita Michel Dagot[1]  em sua obra específica sobre o tema simulação que aborda essa questão do cenário criado para ludibriar terceiro que, assim como no caso do divórcio, tem condão de ostentar dupla significação.

Pela leitura inicial do conceito fica claro que o ponto controvertido no vício da simulação é a discrepância da vontade dos agentes com a declaração exteriorizada em atos jurídicos, atingindo diretamente terceiros.

Assim pode-se concluir que existem grandes diferenças entre simulação, fraude contra credores – exige a má-fé do comprador ou imprudência, [AdSS1] com a aquisição de um bem sem as cautelas adequadas para tanto -, e fraude à execução – dilapidação do patrimônio capaz de reduzir o agente à insolvência, no curso de demanda executiva -, e essas diferenças tornam-se decisivas para identificar o meio adequado para tornar sem efeito a alienação fraudulenta.

  1. Nulidade e anulabilidade

A nulidade é uma espécie de invalidade do negócio jurídico atribuída aos casos mais graves, eis que o ato jurídico nulo possui ineficácia erga omnes e é tido por vício insanável, com exceções extremamente pontuais.

O artigo 145 do Código Civil de 1916[2] consignava que os seguintes atos eram nulos: (i) aquele praticado por pessoa absolutamente incapaz; (ii) aquele cujo objeto fosse ilícito ou impossível; (iii) aquele que não preencher as formas previstas em lei[3][4]; (iv) aquele que não preencher solenidade determinada pela lei como essencial para sua constituição e; (v) aquele que a lei taxativamente declarar nulo.

Já o Código Civil de 2002, em seus artigos 166[5] e 167[6], estabeleceu como nulos os seguintes atos: (i) aquele praticado por pessoa absolutamente incapaz; (ii) aquele cujo objeto for ilícito, impossível ou indeterminado; (iii) aquele cujo o motivo comum foi ilícito; (iv) aquele que não cumprir forma prescrita em lei; (v) aquele que não preencher solenidade determinada pela lei como essencial para sua constituição; (vi) aquele praticado com o intuito de fraudar lei imperativa e;  (vii) aquele simulado.

Embora existam diversas causas de nulidade, somente a Simulação interessa para desenvolvimento do presente artigo, ressaltando que a problemática se dá pelo fato da mudança de tratamento da simulação no tempo, uma vez que o novo ordenamento considera a simulação um vício social, agravando assim sua visão negativa perante a sociedade.

No que concerne à anulabilidade, esta é uma espécie de invalidade do ato jurídico, incidente sobre os casos de menor gravidade, tendo em vista que os casos tidos por graves no Código Civil são passíveis de nulidade.

O Código Civil de 2002, em seu artigo 171, estabelece quais são as hipóteses de anulabilidade do negócio jurídico, a saber: (i) casos expressamente declarados anuláveis na lei; (ii) pela incapacidade relativa do agente e; (iii) por vício decorrente de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.

Reitera-se que durante a vigência do Código Civil de 1916 a simulação também era causa de anulação, fato que foi alterado pelo Código Civil de 2002, que passou a considerá-la suscetível de nulidade, até mesmo por ser matéria de ordem pública em razão da gravidade e da reprovação social da realização de conluios ou tramas com o objetivo de fraudar.

Após ser anulado o negócio jurídico, as partes retornaram ao estado anterior à celebração do negócio e, não havendo possibilidade de eventual restituição do status quo pela natureza da operação, as partes serão indenizadas com o equivalente[7].

Importante destacar que a anulabilidade do negócio é atingida pelos efeitos da decadência, ou seja, somente pode ser reconhecida se suscitada dentro dos prazos legais e após decurso dos prazos, sem que seja apontada sua ocorrência, será convalidado, ou seja, continuará a produzir seus efeitos.

O prazo decadencial para pretender a anulação de negócio jurídico é de quatro anos em caso de coação, erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo, lesão ou incapacidade relativa ou de dois anos nos casos não previstos em lei, nos termos dos artigos 178[8] e 179[9] do Código Civil de 2002.

Após a breve conceituação da anulabilidade e nulidade, restam nítidas as consequências da aplicação o Código Civil de 1916 ao ato simulado, eis que o referido instrumento normativo o considerava anulável e não nulo, portanto, ficando eventual credor à época à deriva do decurso do tempo, o que não mais ocorre na vigência do novo diploma em curso[AdSS2] , [HdMP3] vez que o tema é tratado por nulidade, ou seja, nunca produziu efeitos.

  1. A ação declaratória de nulidade

Repisa-se no presente tópico a necessidade de distinção entre a simulação e fraude contra credores, pois saber diferenciar os institutos se revela crucial para pleitear a ineficácia de eventual alienação de bens em cada caso concreto.

Para arguição de fraude contra credores, aquela em que o credor precisa comprovar a má-fé do adquirente[AdSS4]  – com a exceção de presunção de pai para filho - o ordenamento jurídico fornece no artigo 161 a possibilidade de ajuizamento da Ação Pauliana. Já para arguição de simulação o caminho a ser seguido passa por ação de cunho ordinário, a qual o credor suporta o ônus de ligar os pontos e comprovar a ilusão formada entre os entes, a fim de ludibriar e assim blindar o patrimônio.

Ademais, além da diferença no que tange à fundamentação legal, é certo que a identificação da ação correspondente à pretensão facilita na estratégia a ser tomada, tanto no que toca à produção de prova documental quanto testemunhal, ao passo que na ação pauliana se busca comprovar a má-fé do adquirente – como exemplo a ausência de pesquisa nos cartórios de distribuição na Comarca do imóvel adquirido-. Na ação declaratória, como esta visa identificar o conluio, a produção fica por conta de depoimentos pessoais e, eventualmente, confronto de datas[AdSS5]  e documentos, sendo que hoje em dia pode também ser comprovada por trocas de e-mails, por exemplo.

Portanto é indispensável levar em consideração, além das questões de caducidade de direito, o tipo do vício suscitado para instruir corretamente a ação, e desta forma garantir a efetiva prestação jurisdicional.

  1. Dos critérios para definição do Diploma Legal que deve ser aplicado ao ato simulado praticado durante a vigência do Código Civil de 1916 e que produz efeitos durante a vigência do Código Civil de 2002

O Código Civil de 2002 demonstrou uma maior preocupação ao tratar da simulação pois a considerou um vício grave, que gera efeitos além dos pactuantes, ou seja, seria um vício de ordem pública e, por esse motivo, poderia ser reconhecido de ofício (em razão da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, houve delimitação das hipóteses de reconhecimento de ofício pelo juiz), arguida por qualquer interessado e também pelo Ministério Público a qualquer tempo.

O ato nulo não se convalida com o decurso do tempo, ou seja, não é atingido pela decadência e prescrição.

Superadas tais pontuações, imagina-se o seguinte acontecimento: um ato foi celebrado durante a vigência do Código Civil de 1916, entretanto somente após entrada em vigor do Código Civil de 2002 venha produz efeitos, e neste período o terceiro prejudicado toma conhecimento da existência da simulação.

Considerando o cenário acima, qual seria o instituto que deve ser aplicado: o instrumento normativo vigente durante a celebração do ato jurídico ou o diploma em vigor à época da produção de seus efeitos e do conhecimento do vício pelo terceiro prejudicado?

Se aplicado o Código Civil de 1916 o ato será anulável e, dependendo do decurso do lapso entre a data da celebração do ato jurídico e o conhecimento do vício pelo terceiro, poderá ter ocorrido decadência/prescrição e o ato será convalidado e eficaz. Já se for considerado que as normas previstas no Código Civil de 2002 são as que devem prevalecer, já que vigente à época da produção de efeitos e conhecimento do vício pelo individuo prejudicado, o ato não será alcançado pela decadência e pela prescrição.

Como anteriormente suscitado a mudança do tratamento se deve ao endurecimento da Legislação em relação aos atos simulados, sendo este vício tido hoje como matéria de ordem pública. Ou seja, a legislação em vigência deixa de premiar os jurisdicionados que elaboram negócios visando ludibriar o Estado e outros entes particulares, retirando o benefício da decadência para os casos em que foram entabulados negócios que não refletem a realidade, bem como a vontade real das partes.

A discussão gira em torno do momento em que o negócio é deflagrado, se os efeitos perduram durante o tempo.

A dúvida surge quando da leitura do artigo 2.035 do Código Civil de 2002, uma norma de transição, a qual prevê: ”a validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução”.

Pela leitura da primeira parte do mencionado dispositivo legal, o ato jurídico constituído antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002 estaria subordinado ao determinado no Código Civil de 1916, entendimento adotado pela jurisprudência para as hipóteses comuns[10][11].

A aplicação indiscriminada do Código Civil de 1916 aos casos que produziram efeitos durante o Código Civil de 2002, e somente após a entrada em vigor do mencionado instrumento normativo o terceiro prejudicado tomou conhecimento sobre o vício, poderá causar danos ao terceiro de boa-fé, que terá que se conformar com a convalidação do ato jurídico em caso de ocorrência de decadência/prescrição, mesmo sem ter tido a oportunidade de alegar a ocorrência do vício por falta de conhecimento.

Agora, se for dado foco na segunda parte do artigo 2.035 do Código Civil de 2002, constata-se que o mencionado dispositivo legal estabelece que se o ato produzir efeitos após a entrada em vigor do mencionado Diploma Legal, à ele se subordinam.

Com o intuito de garantir tanto a segurança jurídica quanto a proteção do terceiro de boa boa-fé, se deve analisar o caso concreto e verificar se o terceiro detinha conhecimento sobre o vício de simulação, se deixou de alegar o vício por sua própria inércia, se o ato jurídico produziu ou não efeitos durante a vigência do novo Código Civil para então definir qual o instrumento normativo deve incidir sob o caso concreto.

  1. Conclusão

Buscou-se no presente trabalho ressaltar ao operador do direito que nem sempre a formação de grupo econômico ou abertura do incidente de desconsideração da personalidade jurídica é a solução para destruir a blindagem concretizada por devedores.

A simulação é muito utilizada na construção de fraudes patrimoniais, e cabe sempre a correta análise para ao ser arguida pelo instrumento jurídico adequado – ação declaratória – com o correto conjunto probatório que a situação merece.

No mais, tendo em vista que muitos atos jurídicos foram celebrados durante a vigência do Código Civil de 1916, mas continuaram a produzir efeitos sob a égide do Código Civil de 2002, após análise de todos os aspectos pertinentes à matéria, a possibilidade de arguir a nulidade e, se necessário, afastar a decadência do ato, deve sempre que possível ser aproveitada ao credor.

A informação acima decorre da análise crítica do artigo 2.035 do Código Civil de 2002, afirmando-se que mesmo que o ato jurídico tendo sido celebrado durante a vigência do Código Civil de 1916, caso produza efeitos durante a vigência do Código Civil de 2002 e o terceiro prejudicado somente tenha conhecimento do vício de simulação durante a égide do novo Codex, não tendo oportunidade de suscitá-lo antes, certamente o Diploma Legal que deverá ser aplicado é o vigente à época da produção dos efeitos e do conhecimento do vício, de modo a evitar que terceiro seja prejudicado indevidamente e o responsável pela simulação seja beneficiado indevidamente.

Assim, com a aplicação do Código Civil de 2002, observadas todas as peculiaridades do caso em concreto inseridas no correto instrumento processual, a simulação será passível de nulidade e não sofrerá com os efeitos da decadência, e tal posicionamento certamente reflete a opinião do legislador ao elevar o status da simulação para vício social, diferindo o entendimento com relação a outras fraudes patrimoniais.

 


[1] Dagot diz que a simulação aparece como uma manifestação da mentira no domínio jurídico.       Não é a única, mas parece ser a mais importante, tanto pela amplitude do domínio em que se manifesta, quanto pelo caráter de gravidade que se reveste. O simulador não se contenta com a simples mentira, verbal ou escrita. Ele cria a aparência, normalmente para enganar terceiros . A aparência ostenta dupla significação: de um lado, visa dar conhecimento do ato simulado a terceiros; de outro lado, ela tem o significado de criação de uma situação falsa, inexata, no sentido de não corresponder à realidade, podendo atrás dela existir a situação real, mas oculta (Dagot in GAINO, Itamar. A simulação dos negócios jurídicos. Coleção Profº. Agostinho Alvim, coordenação Renan Lotufo, 2ª ed., São Paulo: Saraiva 2012, p. 50).

[2] Art. 145. É nulo o ato jurídico:

I. Quando praticado por pessoa absolutamente incapaz (art. 5).

II. Quando for ilícito, ou impossível, o seu objeto.

III. Quando não revestir a forma prescrita em lei arts. 82 e 130).

IV. Quando for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade.

V. Quando a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negar efeito.

 

[3] Art. 82. A validade do ato jurídico requer agente capaz (art. 145, n.º I), objeto licito e forma prescrita ou não defesa em lei (arts. 129, 130 e 145).

[4] Art. 130. Não vale o ato, que deixar de revestir a forma especial, determinada em lei (art. 82), salvo quando esta comine sanção diferente contra a preterição da forma exigida.

[5] Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

IV - não revestir a forma prescrita em lei;

V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

[6] Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.

[7] Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente.

[8] Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:

I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;

II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico;

III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.

[9] Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.

[10] ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO. Compra e venda de bem imóvel realizada sob a égide do Código Civil de 1916.

Alegação de Simulação. Decorrido prazo prescricional de 4 (quatro) anos previsto no art. 178, § 9, b CC/16. Sentença que reconheceu a prescrição e julgou extinta a ação, mantida. TJSP – Apelação Cível nº 0136812-74.2008.8.26.0000; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Relator: Fábio Quadros; Julgamento: 10/11/2011; Publicação: 01/12/2011

[11] APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE CONTRATO. CONTESTAÇÃO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA AÇÃO SUSCITADA.

1. A ação de anulação prescreve em quatro anos.

2. No caso, o ato foi realizado em 03 de setembro de 1992 e a ação de anulação proposta em 14/06/2008.

3. Inteligência dos artigos 295, VI, e 269, IV; 219 e seu § 1º; 468 e 469 do CPC; e artigos 178, § 9º, V, letra b e 172, I do Código Civil de 1916.

4. Extinção do processo pelo reconhecimento da prescrição da ação.

5. Recurso Provido.

6. Votação Unânime. TJPI – Apelação Cível nº 0009445-28.2006.8.18.0140; Órgão Julgador: 2ª Câmara Especializada Cível; Relator: José James Gomes Pereira; Julgamento: 26/10/2010; Publicação: 09/11/2010 (http://www.tjpi.jus.br/e-tjpi/consulta_processo.php?num_processo_consulta=200900010004069).


 [AdSS1]Sugestão: se é má-fé, não pode ter sido imprudência, concorda?

 [AdSS2]Sugestão: vez que, o tema é tratado por nulidade, ou seja, nunca produziu efeitos.

 [HdMP3]Na verdade o Código de 1916 tratava a simulação como anulável, é podia produzir efeitos

 [AdSS4]Pode ser presumida se de pai pra filho

 [AdSS5]Eventual documento (troca de e-mails)

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